A DGS, segundo as notícias, está a reconsiderar a recomendação sobre o uso generalizado de máscaras. Parece que também a OMS. Há dias, o CDC americano também o recomendou, embora dizendo que, para os não infetados, bastava qualquer proteção facial, como um lenço de pescoço.
Há muita incerteza sobre a eficácia das máscaras, no que diz respeito à proteção de quem a usa e sobre o balanço entre esta proteção e os riscos do uso da máscara (o mesmo para as luvas). Os argumentos científicos são apenas indiretos, baseando-se em estudos sobre o tipo de partículas expelido pelos infetados e a distância que elas podem atingir.
Outra coisa é a sua utilidade indiscutível para reter a emissão de gotículas pelos infetados. Como tenho dito repetidamente, é claro que, a partir de determinado momento, ambas as coisas estão associadas, em termos de saúde pública. O uso generalizado de máscaras, quando a epidemia tem grande extensão e andam pelos espaços públicos possíveis infetantes, diminui, pelo segundo fator, a transmissão do vírus. Justifica-se assim, por exemplo, a recomendação americana, quando já vão em mais de 330 milhares de casos, com grande concentração deles em Nova Iorque. Aceito bem que, mesmo com muito menor número de casos, se venha a recomendar o uso generalizado de máscaras em Portugal, agora que o mercado parece em vias de estar abastecido.
Sobre isto, três notas:
1. Tem-se falado no sucesso da Chéquia, que desde o início impôs o uso generalizado de máscara. Passados hoje 23 dias sobre o dia-100 casos, tal como em Portugal, têm 4475 casos, menos de metade dos nossos. A taxa de expansão, paralelamente, também foi menor do que a nossa, durante os primeiros 10 dias, mas passou depois a igualar-se, em termos gerais, variando entre 0,07 e 0,11. Não vejo, à primeira vista, onde está esse grande sucesso. Por outro lado, essa foi uma medida entre muitas outras de bloqueio (termo que vou usar para o agora vulgarizado “lockdown”). Não é possível determinar o seu grau específico de impacto.
2. Este é mais um foco de agitação dos catastrofistas. O uso de máscara é vozeado em grito pelos diretores das escolas médicas, cujo porta-voz de facto, Fausto Pinto, é cardiologista. Dizem representar a academia, coisa que pode ter sentido corporativo ou institucional mas nunca científico. Avançam os argumentos científicos que referi acima, mas tornando-os absolutos e como “sound bites”. Se se alimentar estas posições, hoje são as máscaras, amanhã será qualquer outra medida, sempre mais exigente, na onda do que lhes dá protagonismo. O seu caso é particularmente criticável quanto, dado o impacto institucional e político que têm – tal como o bastonário da Ordem – gozam de meios e canais privilegiados para fazerem chegar a sua opinião aos centros de decisão, sem necessidade de virem para a praça pública causar agitação.
3. A meu ver, a DGS está na posição da mulher de César. Não pode haver qualquer suspeita de menor lisura, por ser absolutamente necessária a total confiança das pessoas, numa situação em que se vão prolongar a condições difíceis em que elas estão viver. Assim, é perigosa a coincidência entre uma recomendação para o uso generalizado de máscaras e a sua agora disponibilidade no mercado (que, ao que julgo, ainda não se está a ver). “Pois, antes não era preciso; é porque não havia máscaras”. É imperioso que a DGS, se o vier a recomendar, fundamente muito claramente a decisão, de forma inteligível para as pessoas.