Todo um discurso sistemático, desde a qualidade universitária e científica à política de quadros no e para o desenvolvimento, nos atira com indicadores, e desde logo o número de doutorados. Estou farto de indicadores quantitativos. Só servem para agredir a minha inteligência e capacidade de análise.
Temos muitos, poucos, bastantes, em crescendo, doutorados? O que me interessa é com que nível, com que qualidade, temos doutorados. Admito que só posso falar um pouco de fora, porque há quase vinte anos que não tenho orientação de doutoramentos. No entanto, pelo que ouço de fontes credíveis, julgo ter uma ideia realística da situação atual, mesmo que, na minha vida ativa, eu desconhecesse gabinetes de comunicação, grandes notícias antes da publicação de trabalhos, redes de publicação, avaliação e tráficos de influência.
O grosso dos meus doutorados foi do programa Ciência e pude selecioná-los com o meu critério. Não me desiludiram. Hoje vêm na fileira da licenciatura, do mestrado. Selecionados convencionalmente, pelas notas. Os programas de doutoramento apresentados à A3ES dizem coisas bonitas, competências, entrevistas, motivação. Na prática, “encornanço” nos graus anteriores, iliteracia informática e comunicacional, incapacidade linguística, incapacidade de detetar a mais primária falácia. Mas a internacionalização, senhores! Receba-se tudo o que vem fazer o ranking e o orçamento de propinas, mesmo que a nivelar pelo subdesenvolvimento educacional dos países de origem.
Está a morrer a última geração capaz de uma crítica qualitativa. Sabíamos o que era bom sem precisarmos de índices e fatores de publicação. Sabia-se avaliar uma tese, sem mais. Sabia-se distinguir investigação científica de discurso político, ideológico, de opinião. Sabia-se o que era raciocínio crítico. “Cheirava-se” a qualidade. E até havia um sentido estético na ciência, falando-se de trabalhos bonitos.
Hoje, um doutorado é o resultado final de uma série de algoritmos que formatam, neste admirável mundo novo, “the idea of a university”. Pobre goog old fellow, John cardinal Newman.